André conta que
no primeiro ano de prefeitura, chegou a gastar cinco mil reais comprando
softwares para exercer a função.
“Somente com um sistema de intranet que eu desenvolvi,
gastei cerca de R$ 2.500,00. Uma empresa de fora chegou a se interessar e
queria comprar o sistema para vender para outras prefeituras. Mas eu não quis
vender. Nunca tive um gestor me solicitando serviço, nada. Por conta própria,
eu comecei a fazer projetos que eu achava interessantes para a administração.
Criei uma implementação do e-Cidades para fazer testes. O
e-Cidades é um software livre criado pelo Ministério do Planejamento para
pequenas cidades usarem. Hoje a prefeitura gasta R$128 mil por mês com a
empresa Sistema Modernização Pública, para fazer o que o e-Cidades faz de
graça. Enquanto eu implementava isso, me diziam lá dentro: “Não mexe nisso
cara, a empresa é de alguém aí de dentro”.
Criei um site, TIBúzios.com e peguei os meus projetos e
coloquei neste site para que todos pudessem ter acesso. Gastava R$ 300,00 por
mês para manter o site no ar com os projetos. Está tudo lá que eu desenvolvi e
ninguém usa porque não quer. Eu apresentava aos gestores, eles gostavam e
morria aí. Nada era implementado.
Gestores demonstraram não saber o que um analista de
sistemas faz e quando cheguei queriam que eu montasse computadores e fizesse
manutenção. Conversei com meu gerente de setor e expliquei pra ele que eu seria
mais útil fazendo outras coisas. E dei como exemplo o fato de ninguém saber
onde estão todos os computadores do município. Quantos são contratados, quantos
são alugados, o que foi comprado? Quem são as pessoas que utilizam, e a demanda
de utilização? Então o analista pode criar ou implementar um sistema que faça
isso. Vamos fazer? Ele topou e eu fui construir um sistema de inventário para
termos uma visão geral de quantos computadores são e onde estão. E também das
peças de reposição, porque a sala de manutenção é uma bagunça.
Feito o sistema, a etapa seguinte é inserir os dados. Aí
começou aquela história. Esse computador aqui não tem como inserir porque era
de uma licitação que já acabou o prazo e a empresa não veio buscar o
computador, esse outro também não dá… e o sistema de informática representa
sempre o mundo real. Se o mundo real não é organizado, o sistema também nunca
vai ser. Então essa ideia caiu por terra.
Hoje o sistema de informática da prefeitura é defasado,
obsoleto, tudo lá é ultrapassado. Quando a pessoa vai ao hospital e lá está sem
sistema, está fora do ar, isso acontece por problema interno da prefeitura. O
executivo de Búzios não entende que tudo hoje é tecnologia”.
Licitações na área de informática
“Neste final de ano, começaram muitas contratações de
informática, muita coisa de tecnologia. E nada disso passava pelo setor de TI.
Quando veio a licitação de internet, me pediram para elaborar o Termo de
Referência, mas mudaram tudo e o que foi contratado começou a dar problema. Aí
mandaram para eu resolver. Mas eu não queria o projeto daquela forma que eles
fizeram porque sabia que ia dar problema de fato. Expliquei que teria que fazer
projeto para reestruturação da rede interna, e disseram: “Não isso não
interessa. O problema é computador, vamos comprar computador, porque tá tudo
lento. E eu não fui mais consultado.
Nesse período começaram a colocar gente na sala de
tecnologia, onde fica o servidor central da prefeitura, que controla toda a
rede de computadores e armazena os dados do município. Este aparelho é de um
poder enorme. Tribunais de contas por exemplo, compram um container
refrigerado, fechado com trava e código para se ter acesso aos dados. Informação
vale mais que ouro. Mas na prefeitura o servidor está aberto, totalmente
exposto. Os HDs podem ser puxados para fora e levados embora por qualquer um.
Ali tem informação de contribuintes, terrenos, matrículas, dívida ativa, tudo
do município está ali. E ficar aberto daquela maneira não pode. Ainda mais que
começaram a colocar pessoas aleatórias lá dentro da sala. Fui falar com o
secretário de Administração Rogério Carvalho. Expliquei que existe uma
recomendação do Tribunal de Contas que o setor deve ser fechado.
Secretário de Administração Rogério Carvalho
A secretaria de Meio Ambiente, que tem prédio próprio,
agora funciona dentro da sede da prefeitura, no Centro. Isso gerou um problema
de espaço. Então queriam colocar gente no espaço de tecnologia, espaço de TI.
Colocar qualquer pessoa, e a porta lá está até arrombada. Sumiram imagem das
câmeras de circuito interno em uma troca de governo passada. Hoje o equipamento
com a gravação das câmeras fica dentro de uma caixa de ferro com vidro por
isso. E eu comecei a brigar muito. Toda a prefeitura depende do servidor,
hospital, tudo. E eles ficavam de deboche: “Ah, quer a sala só para você?”
A sala onde eu estava era para ser ocupada por seis
pessoas, três analistas de sistema e três programadores do concurso público de
2012, mas só eu entrei, não chamaram ninguém e a sala era vazia por isso, por
desinteresse da prefeitura que não chamou os profissionais do concurso.
Mesa de trabalho de
André cercada de produtos e até botijão de gás
Então na tentativa de me tirarem da sala onde eu estava
sozinho, começaram a colocar porcarias lá. Resto de tinta, material de obra, coisa
fedorenta. Depois galões de água, o que é extremamente perigoso porque tem os
equipamentos, os servidores, e se um galão daqueles vaza ou estoura na hora de
transportar, pode gerar um curto circuito em tudo. Colocaram também pilhas de
resmas de papel e cinco botijões de gás debaixo da minha mesa. E aí disseram
que lá seria o almoxarifado. Mas isso é loucura, como assim almoxarifado na
sala de TI? Botijão de gás? Tem instrução do Tribunal de Contas para o local
ser isolado”.
Compras baseadas em escolhas
aleatórias, sem embasamento técnico
“Recentemente, a secretaria de Administração estava
fazendo a contratação de aluguel de 350 computadores, para todas as
secretarias. Não seria minha função avaliar estes computadores, mas dentro da
prefeitura, a pessoa de carreira que teria mais condições de analisar isso,
seria um analista de sistemas. Porque não temos mais ninguém de carreira na
tecnologia.
Mas a coisa toda é feita internamente. Internamente eles
escolhem o computador que tem que ser, eles escolhem as empresas a serem
contratadas, eles escolhem tudo e no final o setor de tecnologia que seria o
responsável, nem é consultado. A decisão vem do agente político. O Termo de
Referência da contratação já vem pronto.
Agora estamos prestes a ter uma mudança de gestão. Quando
a próxima gestão entrar vai querer saber porque foram contratados estes
computadores. Não tem como responder porque os agentes políticos que fizeram a
contratação já terão saído.
Na troca contínua de prefeitos que tivemos no ano passado,
isso ocorreu. Entra um e pergunta, quem fez isso aqui. Eu respondo, foi a
antiga gestão. Mas você não é concursado, não estava aqui, você está envolvido
né? Era isso que a gente ouvia.
Agora foram comprados novos servidores. Vi no Portal da
Transparência que o valor é de um milhão e cento e poucos mil. Estes servidores
são para se colocar sistemas dentro deles, o sistema da prefeitura como um todo
e para isso o analista de sistemas deveria ser consultado. E não me consultaram.
Só soube quando já estava comprado. Um dia antes de chegar o equipamento eu fui
transferido de setor. Eu nunca vi estes servidores. Na minha análise técnica
não precisaria de tanto, com 200 mil reais resolvia. Não entendi porque
compraram um equipamento tão caro.
Na verdade, a prefeitura deveria ter um Plano diretor e
deste sair o PD da Tecnologia da Informação, o PDTI. Não existe planejamento.
Fazem qualquer coisa que inventam.
VIDEO
Video gravado por André Castro após secretário de Administração
decidir dividir a sala de Informática com o Almoxarifado
Pegando carona para alugar
computadores
Existe um modelo de contratação que é o de “pegar carona”.
Se um município qualquer fizer uma compra de computadores, você pode aderir a
este registro de preços. Mesmo que seja um valor alto, você pode aderir se
quiser e tem que comprar com a mesma empresa. Se for uma empresa aliada, e
tiver conseguido fazer um registro de preços em qualquer outro município, você
adere e compra com ela. Sem licitação, pegando carona. Quando eu saí eles
estavam querendo “pegar carona” para computadores por preços bem acima dos que
encontramos no mercado.
A Vivo já fornece computadores para a prefeitura e tinha
interesse em continuar fornecendo e até aumentar a quantidade. Ela ofereceu um
valor que é quase a metade do preço apresentado pela outra empresa do registro
de preços. Mas contratar a Vivo implica em processo de licitação pelo menor
preço. Aderindo ao registro de preços não precisa fazer nada, porque se
pressupõe que a empresa já concorreu no outro município e ganhou a licitação
lá. Está sendo feito nesse momento e dessa forma que expliquei, o aluguel de
350 computadores.
Ao invés de alugar computadores, a prefeitura deveria
comprar. Em três ou quatro meses de aluguel, a R$ 350,00 por mês (preço cobrado
pela empresa), já está pago o valor do equipamento. E a prefeitura pode comprar
com garantia de 60 meses. Quando vencer os 60 meses você entrega esses
computadores para as escolas, premia estudantes, e realiza nova compra. Isso seria
interessante”.
Incomodando
Mensagens trocadas entre André e um servidor público durante a
live Roda da Prensa com o Ministério Público do Trabalho, a respeito dos
problemas enfrentados pelos funcionários de Búzios. Medo de perseguição é
constante.
“Indignado com tudo o que via acontecer lá dentro, comecei
a fazer uma série de reuniões internas com pessoas interessadas em encontrar
soluções para a prefeitura, mas na hora de levar estas soluções ao gestor,
ninguém queria. Eu que tinha que levar. Aí comecei a incomodar bastante. Eu
comecei a ser deselegante em certos momentos porque falava a verdade. Dizia que
as coisas estavam sendo feitas de maneira burra dentro da prefeitura e que não
era possível continuar assim. Aí bati nas vaidades. Ninguém mais queria conviver
comigo. Até um amigo meu disse que não poderia mais andar comigo porque tinha
comissão incorporada ao salário e não podia perder. As pessoas se afastam por
medo de perseguição, porque são inúmeras as histórias.
Era pra eu ficar quietinho no meu canto sozinho, mas
comecei a interagir demais, pesquisar muito em outros setores. E sugeria muito
projeto, tipo criar um cartão para controle do abastecimento dos veículos da
prefeitura, melhor gerência da utilização de luz e água, e por aí vai… E isso
incomodou mais ainda o secretário de Administração. Aí sem nenhuma explicação
apareceu uma falta no meu contracheque, por ordem do secretário, sendo que eu
nunca faltei.
Para me candidatar, entrei com pedido de
desincompatibilização por motivo de eleição, inclusive no momento estou de
licença devido à eleição, me candidatando a vereador pelo PSL na chapa do Tom
Viana. Após este pedido recebi falta e aumentou a perseguição e assédio moral.
E eu senti ainda mais o peso: “Você não é do nosso grupo irmão”.
E aí o Rogério me transferiu para a secretaria de
Educação, onde eu não tenho tarefa. E o setor administrativo ficou sem nenhum
concursado para gerir a informação. Em breve teremos uma troca de governo e
quem tem a informação vai embora, sai todo mundo. Nas trocas de prefeito não
existe continuidade de informação. E não existe gestão de conhecimento dentro
da prefeitura. Quer um exemplo simples, o Tribunal de Contas oferece para as
prefeituras treinamento gratuito para procedimentos e tarefas de dentro da
prefeitura, mas o RH não divulga e vão os comissionados que depois vão embora,
e se perde a gestão do conhecimento”.
Prefeito odeia concursado
“O prefeito André Granado é concursado, nas eleições
levantou esta bandeira e hoje odeia concursado. É conhecido por isso. Prometeu
projeto de lei do plano de carreira e nada fez. Este ano não tivemos nossa
reposição salarial em março. Isso é direito da categoria, mas não aconteceu. Os
salários na prefeitura são baixos. As perdas foram grandes nos últimos anos. A
média salarial de um agente administrativo, é de R$ 1.300,00. Tem funções em
que é preciso complementar o valor para alcançar o salario mínimo.
Prefeito de Búzios
André Granado, conhecido entre os servidores públicos por odiar concursados
Acho que Búzios perdeu demais todos esses anos por nunca
termos tido um representante dos servidores públicos na Câmara de Vereadores.
Todos nós perdemos, comunidade buziana inteira e não apenas os funcionários da
prefeitura.
Se tudo funcionasse como tinha que funcionar, a população
teria sempre seus direitos atendidos, sem precisar pedir favor a ninguém, como
acontece hoje.
A defesa do servidor é a defesa da moralidade das
instituições e da qualidade do serviço que é prestado ao cidadão. Porque se tem
um funcionário de carreira a frente dos postos, não vai ter sacanagem, porque
tudo entra na ficha do funcionário. Se ele tiver um incidente, um registro de
penalidade, ele não sobe na carreira. Então ele vai querer ser um cara correto.
E hoje ele tem que fazer as vontades do agente politico para ganhar um cargo em
comissão, porque os salários são baixos demais. Dois mil concursados fazem até
dois vereadores.
É importante destacar a defesa de serviço público e não de
concursado, porque o contratado ganha menos para exercer a mesma função. E o
cargo em comissão tem que servir não pra pagamento de cabo eleitoral do prefeito.
O Supremo Tribunal até decidiu que comissionado não é para
exercer função técnica, que deve ser de concurso. Comissionado é chefia e
liderança. Então toda a máquina está lá esperando função, mas a parte
estratégica da prefeitura cai toda e não tem uma continuidade. Por isso alguns
municípios mantém regras de que 20% de todas as vagas em comissão têm que ser
de concursados. Para o concursado manter o trabalho funcionando”.
Democracia Direta
“Estudando democracia a gente vê que não vive uma democracia.
A gente vive numa república de representatividade. A gente elege
representante e ele fala por nós. Quando a gente vota, dá cem por cento
de confiança e de decisão para o cara eleito. Mas na democracia é o povo quem
decide.
Lá em Atenas onde surgiu a democracia de verdade, na
câmara, que é a casa do povo, quem votava era o povo. Mas agora a gente dá todo
o direito para um sujeito e a nossa opinião não vale mais.
Democracia Direta é um modelo mundial onde de fato as
pessoas que você representa, votam. Os concursados podem ter uma senha e a
vereança não é mais de um, é de todos. Toda a votação que tiver na Câmara, é
disponibilizada para os concursados visualizarem e votarem com a senha. E o que
a maioria decidir terá que ser obedecido. E todos os projetos de lei a serem
propostos devem ser colocados antes para debate. Esse é um modelo que acredito
que se for implantado será um bom passo para a melhora do serviço público em
Búzios”.
Mais informações no portal Prensa de Babe l.
Fonte: https://prensadebabel.com.br/index.php/2020/09/18/servidor-denuncia-assedio-moral-na-prefeitura-de-buzios/
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