O filme Perdido em Marte é um clássico. Ele apresenta o cultivo de
plantas em Marte, além de outros diversos pontos de sobrevivência
enquanto Mark, interpretado por Matt Damon, aguarda por seu resgate. No
entanto, cultivar em Marte envolve uma complexidade muito maior. O filme
não é exato em todas as abordagens científicas – até porque um filme
nem precisa ser.
Basicamente, no filme, Mark conseguiu tratar o solo. Dessa forma, ele cultivou batatas em uma estufa enquanto utilizava suas próprias fezes como adubo. De certa forma, isso parece correto. A composição do solo marciano difere bastante da Terra, mas com nutrientes e água uma planta deveria crescer, não? Bom, não exatamente.
Embora não pareça, o solo é um ambiente muito diverso – cheio de animais e microrganismos que interagem entre si, e exercem uma importância grande para cada um. Trata-se praticamente de relações simbióticas. Por exemplo, estudando em uma escola agrícola eu aprendi muito sobre como as plantas se relacionam com o ecossistema do solo através de suas raízes.
O solo é um sistema muito complexo
Um dos gases utilizados pela planta é o nitrogênio – o gás mais abundante da atmosfera terrestre. No entanto, ele se apresenta na forma N2, e as plantas não o processam assim. Por isso, bactérias fixadoras de nitrogênio colocam o N2 em outras estruturas e o dão para as plantas. Dessa forma, a planta se beneficia com o nitrogênio que consegue utilizar e as bactérias se beneficiam com uma alimentação oferecida pela planta.
No entanto, podemos burlar isso. Uma das revoluções da agricultura em larga escala está na amônia. No início do século XX, o químico Fritz Haber descobriu uma forma eficiente de se sintetizar a amônia. Isso foi muito importante, pois muitas plantas dependem da amônia ou de outros compostos para receber o nitrogênio – e são esses compostos que as bactérias produzem.
Por esse lado, Haber exerceu uma gigantesca importância, já que se não fosse pela sintetização da amônia, provavelmente a crescente população do planeta passaria fome, já que não produziríamos alimentos em uma escala tão grande. Ao mesmo tempo, Haber é um dos pais das armas químicas, e causou a morte de milhares, e até mesmo milhões de pessoas.
O ponto é: se Mark quisesse produzir plantas no espaço, ele também precisaria de bactérias fixadoras de nitrogênio ou sintetizar amônia e outros compostos utilizados pelas plantas para receber o tão importante nitrogênio. É claro que ainda há mais complexidades – estou apenas exemplificando um dos pontos importantes.
Perdido na Terra, cultivar em Marte
Mas
considerando que ele tivesse tudo isso, a tarefa ainda é difícil. Um
grupo de pesquisadores resolveu testar. Em um estudo publicado em 15 de
janeiro no periódico Icarus, mas já disponível, um grupo de pesquisadores testou o cultivo de plantas em três tipos de terra – dois extraídos do Havaí e do Deserto do Mojave, na Califórnia, e o terceiro sintetizado a partir de rochas vulcânicas. Outro estudo que será publicado junto descreve a sintetização do solo.
Nos dois solos naturais, as plantas cresceram sem dificuldade, mas apenas após fertilizadas com um coquetel de nitrogênio, potássio, cálcio e outros nutrientes. No entanto, o solo sintético, o mais próximo de Marte, a fertilização não foi suficiente. Eles tentaram germinar as sementes na forma hidropônica e transferir para o solo. Mas não funcionou.
A primeira suspeitas foi em relação ao pH alto – o solo era básico de mais. Ao corrigir o pH, as plantas sobreviveram por uma semana, mas logo morreram. Além disso, eles esqueceram até aquele momento do perclorato de sódio, um sal tóxico correspondente a 2% do solo marciano – isso é muita coisa.
Há algumas bactérias na Terra que se alimentam de percloratos e liberam outras substâncias não tóxicas. Se os cientistas as utilizarem, poderiam eliminar o sal e cultivar em Marte. No entanto, o problema vai além, e mesmo quando não havia o perclorato de sódio as plantas não sobreviveram por muito tempo. Os cientistas precisam resolver isso para possibilitar futuras missões tripuladas de longo prazo no planeta vermelho.
Os estudos foram publicados no periódico Icarus [1] e [2]. Com informações de Science News
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